terça-feira, 25 de outubro de 2011

Ainda sobre os cortes...

Hoje a comunicação social noticia que os juízes entende que os cortes nos subsídios da função pública são inconstitucionais. Será que o são?

Uma das explicações simples do Princípio da Igualdade traduz-se de forma simples em "tratar de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente". O meu Grande Professor de Direito Constitucional I costumava dar um exemplo muito claro: se tivermos um tipo muito grande e outro muito pequeno e lhes entregarmos duas espadas exactamente iguais... um deles vai ter problemas, porque é impossível que o tamanho da espada seja adequado aos dois.

Assim, por muito que tentem vitimizar o sector público, considerando isto uma discriminação... convém não cair em dois erros muitos frequentes: 
- o primeiro: diabolizar a função pública. É certo que basta entrar num serviço público para a gente ponderar três vezes se consegue voltar a repetir esta ideia... mas, sejamos correctos, há bons e maus profissionais em todo o lado (não esquecendo porém que os maus profissionais do sector privado não são pagos com os nossos impostos);
- o segundo: não vitimizar o sector público. Porque se durante anos houve gente com tratamento preferencial foram precisamente esses funcionários pagos pelo Estado.

Estranho por isso que os Senhores Juízes vejam agora discriminação onde deveriam ver sacrifício temporário, porque o que os Senhores Juízes omitem (e não podiam em qualquer caso fazê-lo) é que se uma qualquer empresa do sector privado tivesse as contas no mesmo estado que o Estado, não anunciaria cortes nos subsídios, anunciaria sim salários em atraso e a apresentação à insolvência. 
A precariedade e insegurança de qualquer trabalhador no privado não se compara à precariedade laboral dos "mais precários" ao serviço do Estado.

Outro exemplo? ADSE!! Durante anos, os trabalhadores do Estado beneficiaram, a troco de uns euros (míseros, diga-se, quando ponderados com as vantagens) de um sistema de saúde que dava para quase toda a família. Porque é que os funcionários públicos descontavam para a ADSE que lhes dava acesso a um "seguro de saúde" muito bom, e os do privado descontavam para o SNS que quando funciona é bom... mas quase nunca funciona como devia? Não havia aqui discriminação? Porque é que uns eram assistidos nas melhores clínicas (sim podiam até escolher) e os outros eram e são assistidos na "vala comum" do SNS da área de residência (quando há! Porque a tendência é fecharem)??

Porque é que uns se habituaram a ter pausas de 15 minutos de manhã e à tarde (algumas bem prolongadas) e outros até o tempo para ir ao WC é contado? São estes últimos os privilegiados? Estes que vão ter que trabalhar a mais o mesmo tempo que outros têm para tomar o belo do cafésinho?

E depois há o elemento "decisor": que outra opinião seria de esperar dos juízes quando opinam "em causa própria"?

Até fazem lembrar os fulanos a Associação Nacional de Sargentos: gente muito indignada com os cortes dos subsídios! Gente que ameaça ir para a rua defender o povo... Julgo é que se fossem "defender o povo" com a folha salarial à vista... alguns ficariam escondidinhos em casa "para não levantar ondas", não fosse alguém ver com quantos zeros se escrevia aquela indignação toda!

Aliás, estou em crer que muitos deles perderão a folia nas vésperas da "manif" se alguém lançar para a comunicação social umas manchetes tão simples como "quanto ganha uma patente militar X ou Y"!


Obs: compreendo a indignação de todos aqueles que sofrerão os cortes, afinal de contas todos queremos melhores condições de vida e nos dias que correm, poesias à parte, o factor económico é de extrema importância! O que não compreendo é a indignação de muitos que não possuem a sensibilidade de olhar em volta e perceber que 1000 € é para muita gente o equivalente a mais de 2 meses de trabalho, e essa gente que ganha o salário mínimo também paga casas, paga contas, tem filhos e sobrevive. E não são menos dignos que todos os outros. Mais não fosse, por respeito a esses, deveriam ser mais "comedidos" na sua indignação.

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