A recente notícia sobre o chumbo de 90% do candidatos que se apresentaram a exame de acesso ao estágio na Ordem dos Advogados veio, mais uma vez, dignificar em muito pouco a classe.
O Bastonário da Ordem dos Advogados, Dr. Marinho Pinto, disparou mais uma vez para todo o lado, fazendo lembrar um japonês de Kodak em punho!
É certo e sabido que o Dr. Marinho Pinto até tem razão em muito do que tem dito ao longo dos tempos mas, não é menos certo, que tem dito outras tantas sem nexo, em jeito de político, e na maioria das vezes quer diga certo ou errado acaba por dizê-lo com tom pouco ou nada credibilizador das palavras. Perde-se muito do conteúdo por exageros na forma.
Já toda a gente sabe que há meandros pouco ou nada desejáveis no que diz respeito a licenciaturas e docentes, que há gente que ganha uns bons trocos saltitando entre ensino público e privado, mas também toda a gente sabe que há trigo e joio em todo o lado e que os tempos do tribalismo entre ensino público e privado já vão longe.
Que Bolonha parece ser uma trapalhada também parece não restar dúvidas, quer dizer, parece é inequívoco que Bolonha é injusto para os licenciados anteriormente. No que me diz respeito, fiz uma licenciatura de 5 anos obrigatórios em estrutura 4 + 1 (quatro anos de formação geral e um ano de opção entre três ramos: publicistas, empresariais e forenses). Prossegui para o mestrado e tive mais um ano de parte lectiva com Metodologia e Seminário de Análise e Crítica de Legislação e Jurisprudência e desde então a esta parte ando enterrado em apontamentos, livros, folhetins e códigos na firme esperança de que a minha tese possa tardar mas que saia uma "coisinha jeitosa"!
Ora, se eu tivesse chumbado uns anitos, teria um curso de direito de 4 anos e, ficando mais um anito pelos bancos da faculdade, saía de lá com uma monografia de fim de curso a que chamariam tese! Aquilo que para mim se faz num caminho penoso de 4+1=5 e 5+2=7, para Bolonha resume-se a um 4+1=5!
A pergunta impõe-se: se o meu curso teve a estrutura Obrigatória de 4+1, sendo que este 1 era em área de especialização, porque não sou eu hoje mestre? E sou apenas licenciado? Eventualmente dirão que me faltava um trabalho de fim de curso, mas nesse caso eu bem que pegava num qualquer dos meus trabalhos ao longo do curso, mudava-lhe o título e chamava-lhe "tese" e ía defendê-la! Podem também dizer-me que a carga agora é maior a nível de cadeiras semestrais: aqui tenho que dar razão ao Bastonário da OA! Uma licenciatura não deve ser uma prova de sprint: vou ali à universidade 3 anos e já volto Dr. (há quem faça ainda mais rápido, ao jeito: vou ali descerrar uma placa de inauguração e volto Dr.).
Por outro lado: aqueles que prestam conhecimentos perante Doutores (e é a própria OA que reconhece o estatuto "pessoal/profissional" dos juristas de reconhecido mérito e dos Professores Universitários) são na Ordem avaliados por aquilo que vulgarmente se designa de "colegas mais velhos"! Ou seja, na faculdade sou avaliado por alguém que derreteu pestanas para ser Doutor e Professor (e não me venham dizer que é fácil porque não é! Quem o diz é dotado de uma sapiente estupidez) e na Ordem, os conhecimentos que eu defendi perante um Doutor são colocados em causa por meia dúzia de "dr.s"??? Há quem diga que alguns deles sofrem de frustração por nunca terem chegado à docência universitária e precisam deste tipo de palco para se sentirem grandes!
Ora, que os estagiários deixam muito € nos cofres da Ordem parece de todo evidente também... mas daí a gneralizar, a dizer que toda a gente que anda pelos Conselhos Distritais é isto ou aquilo, que vivem daquilo, que têm ali uma "mama"... bem... Sr. Bastonário... às vezes, levar um pouco mais a sério o Estatuto dava um pouco mais de credibilidade à coisa!
Será digno, ou no limite lícito, que um Bastonário acuse os colegas de profissão, titulares de Órgãos democraticamente eleitos dentro da estrutura orgânica da Ordem, de actos de "auto-favorecimento", de criação de "artimanhas" para encher os bolsos? Será digno e lícito? Estas pessoas não têm honra? Já não falarei do que isto possa representar em termos de violação deontológica pois, no fim de contas, eu ainda vou prestar mais uma vez provas sobre a matéria e o Sr. Bastonário já tem isto sabido de cór! É certo que eu devo ter isto bem mais fresquinho na memória, e talvez por isso não uso aqui palavras desmedidas: dizem que cautelas e caldos de galinha... E em boa verdade, não gosto de circular tão próxima da faixa central, embora reconheça que anda por aí muito boa gente a jogar no limbo, a usar palavras, afirmações e insinuações perigosas mas com plena consciência de que facilmente se retractam delas.
Obviamente, se eu estivesse num lugar de poder, e quisesse levar "a água" às minhas estatísticas... não seria difícil fazer um exame em que 100% dos candidatos chumbassem! Por isso... estatísticas feitas em causa própria valem o que valem! É um pouco como um jogo de futebol em que quem faz as regras (entenda-se exame), quem joga (entenda-se corrige) e quem arbitra (quem faz o balanço) é tudo da mesma equipa! Será isento? Não creio!
Uma aspecto que julgo fantástico, e porque já o senti de forma muito violenta na pele, é que numa estrutura tão cumpridora como deveria ser a OA o princípio da igualdade não vigore! Isto porque, se dois correctores tiverem entendimento oposto, apesar de uma grelha única, um examinando não pode anexar ao seu recurso o exame de um colega que tenha resolvido uma questão com base em idêntico pressuposto fazendo valer assim o princípio da igualdade! Princípio da igualdade na OA é um pouco como um acto de fé: rezar para que os exames parem em correctores humanos e não naqueles frustrados do sistema!
Em suma: nem o Sr. Bastonário tem a razão toda nem os conselhos distritais... mas em boa verdade, este jeito Francisco Louçã da advocacia em pouco dignifique a estrutura.
E concluindo de todo: faz-me confusão que num mundo em que o mercado sabe escolher tão bem haja quem tema a concorrência! Só devem ter medo da competência ou falta dela dos advogados-estagiários ou jovens advogados aqueles que pela sua própria incompetência temem ser relegados para segundo plano. Qual o medo que haja bons e maus profissionais? Não os há em todas as artes? O bom profissional seguramente vingará, o mau, não terá certamente tempo de prejudicar clientes com a sua impreparação, pois ao nível que está a oferta e o "feeling" das pessoas rapidamente fecham a porta! Em meu humilde entender, deixem o povo entrar no mercado de trabalho: os que sobreviverem são bons e o público ganha com isso, os que não sobreviverem mudarão rapidamente de vida. Medo de quê afinal? Da expressão: não sei fazer isto? Não creio, pois durante o meu estágio essa foi a melhor expressão que me acompanhou: sempre que me deparei com algo que não sabia fazer, aprendi! Por isso, tivesse eu deparado com mais "não sei fazer" porque teria aprendido muito mais ainda.
E isto digo eu! Sem qualquer limbo deontológico!
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